segunda-feira, setembro 15, 2008

Saga da Lua

Uma Troll chamada Unga e uma guerreira chamada Skor.

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Ora bem, antes de começarmos quero esclarecer aqui dois pontos:
1º Nem imaginam a quantidade de comida de plastico brutalmente assassinada para acabar este post
2º Este post foi feito para ser lido com a banda sonora de: Symphony X, Ayreon, Lori Linstruth, ou Kiuas

Sem mais demoras... o post:
Enojy
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Vi a aldeia a movimentar-se à minha frente. Guardas amontoavam-se na entrada enquanto os ocupantes da aldeia escondiam-se nas suas casas. Com passos convictos eu avancei, a minha cabeça pendeu para a frente e com as duas mãos ergui a minha espada. Os trolls foram afastando-se um pouco conforme eu fazia o meu caminho. Olhei para eles com um sorriso na cara. Eram na maioria mancebos, não me parecia haver trolls acima dos 25 anos no grupo e todos eles estavam aterrorizados, não entendia porquê, o meu porte não era o de um guerreiro poderoso como alguns deles, no entanto continuavam a afastar-se. Foi-se abrindo um corredor entre os guardas por onde eu caminhava, sabia que mais tarde ou mais cedo eles iriam cair em cima de mim por isso não baixei a defesa. Estavam todos hesitantes, temiam-me e mesmo sem reconhecer as razões esse facto punha a minha adrenalina ao rubro. Eu sabia que estava em desvantagem, para alem disso encontrava-me cansada pois não tinha descansado desde que parti da montanha com a Kaly, as minhas mãos doíam-me devido a quando descarreguei a minha fúria numa árvore, no entanto sentia-me superior às dezenas que me rodeavam. Era uma sensação estranha, talvez fosse da adrenalina, mas eu via o seu futuro nas minhas mãos e um fio de sadismo fez-me soltar uma gargalhada. Os jovens guerreiros entreolharam-se assustados. Não os podia julgar pois eu devia estar a dar um ar de louca.
Após mais umas passadas o corredor parou de se abrir e começou a fechar-se. Estava completamente cercada de trolls, à distância estava um altar completamente preparado para uma cerimónia e Urnia esperava ao seu lado olhando para mim com ódio cravado na cara. Acho que ela sabia quem eu era, ao contrário de muitos dos outros. Olhei em volta e notei novamente que os que me rodeavam não eram os mais corajosos guerreiros Troll mas somente os mais novos que me faziam frentee não conseguia entender essa atitude. No meio do emaranhado de azul e metal reluzente consegui diferenciar uma cara. Thorg, aquele que se achava o par perfeito para Unga e agora que a vida dela estava ameaçada, nem um dedo movia para a salvar. Fechei os olhos por segundos sendo assolada por uma grande raiva. Cerrei os dentes e deixei escapar um grunhido antes de gritar.

- Thorg! – Apontei a espada para ele deixando-o algo surpreso.
- Co... Como sabes o meu nome? – Questionou ele assustado, obviamente não me reconhecia como o lobo que à dias ele próprio tinha expulso desta aldeia. Era algo normal.
- Cala-te e vem lutar comigo se tens coragem!
- O capitão da sacerdotisa Urnia luta com ninguém. – Retorquio um jovem troll, este já agarrava a sua arma mais convictamente.
- Para lutares com ele terás de passar por nós primeiro criatura maligna. – Gritou outro que se lançou rapidamente contra mim.

E assim começou, o guerreiro atacou-me com uma espada, mas o meu golpe superou o seu e a sua arma voou-lhe das mãos. Enraivecida e cega pelo desejo que me tinha trazido a este lugar apliquei um segundo golpe no troll, fazendo o sangue jorrar. Talvez devesse ter sido mais ponderada e controlada pois ao ver os olhos do jovem troll pejados de medo a olhar para alguma forma indefinida conforme a vida escapava do seu rosto, fui bombardeada por gritos de fúria vindos de todos os lados. Antes de sequer o primeiro troll que me atacou cair já outros dois saltavam para cima de mim, antes de conseguir trespassar o segundo, mais dois se juntavam à luta. A minha mente fechou-se num estado de transe onde apenas o choque do aço e os movimentos do corpo se sentiam. Lutava com um, desviava-me de outros dois enquanto tentava bloquear um quarto, tentando contudo na minha fuga não me lançar contra um aglomerado de armas que me esperavam. Era um emaranhado de golpes, faíscas e gritos, confuso para os olhos, nauseabundo para no nariz e irritante para os ouvidos. A minha mente cansou-se rapidamente e senti o meu corpo a entregar-se à luta fechando todos os sentidos dispensáveis. Senti o frenesim do sangue e aço a tomar conta de mim e dancei a terrível dança da morte, perfeitamente coreografada. Já não precisava de me desviar ou recuar, aqueles que me atacavam caíam com um golpe bem antes de outro me tentar golpear. Caíam mais rápido do que conseguiam chegar perto.
Trespassei um troll que percorreu toda a lâmina, fazendo-me sentir o cheiro do seu sangue, vi a sua face sem vida e lutei contra o seu peso a pender sem força própria. Afastei-o com o pé. O corpo caiu no chão com um ruído seco. A batalha tinha cessado, pelo menos por instantes, pois os trolls que estavam vivos encontravam-se apavorados demais para se aproximar. Eu estava coberta de feridas e cortes fazendo a dor latejar no meu corpo, respirava ofegantemente e as minhas pernas tremiam em diversos instantes. O sangue pingava abundantemente da minha lâmina. A sua cor tinha-se banhado de carmim que combinava com a cor dos rubis que adornavam os olhos dos lobos, ainda esfomeados por carne e sangue. Eu mantinha um sorriso leve no rosto quando comecei a avançar lentamente e de espada erguida por entre os corpos. Fechei os meus punhos firmemente em volta da espada, pois na distância consegui ver algo que me fortaleceu a determinação. Era Unga, sendo arrastada por dois trolls em vestimentas estranhas em direcção de Urnia, essa estava ajoelhada em frente a um altar, rezando numa língua desconhecida para mim, preparando-se para a continuação do ritual. Ao seu lado estava uma troll que afiava de forma cerimoniosa uma pequena navalha. Não demorou a ser pintado o quadro na minha cabeça e estremeci ao entende-o.
Vendo a minha distracção Thorg procurou um ataque rápido e eficaz que por sorte consegui bloquear. O seu machado embateu na minha arma com uma força tremenda e só por pouco não perdi o equilíbrio. Ele fez outra investida rápida que consegui bloquear outra vez, mas mais debilmente pois juntamente com as feridas no meu corpo, o impacto do seu primeiro ataque deixara os meus braços fragilizados.
Em nossa volta ouvia gritos de apoio ao capitão, mas os meus olhos distraíram-se outra vez nas acções de Urnia que já tinha acabado a sua reza e agora estava erguida perante Unga que tinha sido colocada no altar.
Thorg investiu outra vez fazendo-me levantar a espada em defesa, mas desta vez prevendo a força do seu golpe deixei a lâmina do seu machado receber pouca resistência e deslizar pela minha espada fazendo-o perder o equilíbrio. Vi a faca a ser entregue a Urnia e erguida no ar. Com uma reacção rápida larguei o cabo da espada com uma das mãos e de punho fechado bati violentamente na face de Thorg, projectando-o para o chão. Comecei a correr em direcção ao altar mas tendo de parar pois inspirados pelo seu capitão os guardas voltaram a fazer-me frente. Na minha raiva e adrenalina derrubei-os rapidamente sofrendo ferimentos que apesar de mais fundos que simples arranhões não me fizeram parar. Ao retomar a corrida, o meu sangue gelou no momento que a navalha começara a descer sobre o peito de Unga. Antes de a minha garganta soltar um grito de terror, vi algo que pareceu uma intervenção dos Deuses. A mão enrugada de Yorgsh parara a sedenta de sangue de Urnia. Agradeci a todos os Deuses que pudessem existir pela presença do ancião naquele momento em que Urnia quedou-se olhando para Yorgsh com cara pejada de ódio, enquanto que ele retribui-a a esse olhar com uma cara serena. Aquela cena pareceu-me um confronto entre titans de forças opostas que eclipsava tudo o resto.

- Seu velho insolente, o que pensas que estar a fazer?
- Algo que já deveria ter feito à muito tempo Urnia!
- Tu estás débil, já não tens forças para te levantar quanto mais liderar!.
- E tu Urnia? Nunca esperei que a minha amada mulher fosse fraca o suficiente para cair sob o encanto do Jotun. Distorceste as palavras dos oráculos e criaste a tua própria verdade. Verdade essa que alimentaste às pobres almas jovens que jorraram sangue e a sua vida por ti! Por essa verdade que fabricaste!

Ouvi um rugido vindo de trás de mim. Num reflexo rápido, brandi a minha espada velozmente atingindo Thorg que se lançava novamente a mim no peito. Atingido pela surpresa do golpe, Thorg agarrou-se à sua ferida, tossindo sangue antes de cair no chão. Voltei a olhar para Urnia que nesse exacto momento derrubou Yorgsh. O meu tempo era escaco, portanto lancei-me novamente numa corrida desenfreada. Urnia ergueu novamente o punhal com as duas mãos e gritou,

- Este será o fim do tormento! O sangue purificará, o sangue alimentará! Eu serei uma Deu…

Antes de terminar a frase eu trespassei as suas costas empalando-a na minha espada. Cravei-a bem fundo nas suas costas vendo a extremidade a irromper pelo ventre. Senti uma vontade imensa de gritar de raiva, mas não consegui, a minha expressão manteve-se estática e firme. O sangue escorria abundantemente pelas minhas mãos e o momento parecia prolongar-se infinitamente, assim como o ultimo momento de Urnia.
Perdi as forças para segurar a lâmina e deixei-a pender para baixo. O corpo de Urnia deslizou pela lâmina em sentido oposto caindo inanimado no chão envolto em sangue. Segundos depois um grande vulto negro ergueu-se do corpo de Unga, sem expressões ou forma definida e soltou um enorme grito antes de esvoaçar pela aldeia e desaparecer para alem da orla da floresta. Larguei a espada e desloquei-me até ao altar. Perdendo sangue e com a visão turva com um cansaço extremo pequei na Unga e abracei-a fortemente contra mim. Consegui sentir o meu coração a acalmar, toda aquela raiva e fúria a desvanecer, encostei a minha face à de Unga e suspirei.

- Já acabou… já acabou.

Tudo ficou negro e desmaiei.

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Acordei com as feridas quase todas saradas e as mais graves a serem tratadas por um troll e pela sua filha. Reconheci a filha como a rapariga que tinha afiado o punhal a Urnia. Antes que pudesse ter dito algo num apelo de fúria, a rapariga agarrou na minha mão e pediu mil desculpas. O seu olhar baço estava cravado na minha cara repleto de lágrimas, era cega. Mais tarde o seu pai explicou-me que tinha acontecido o mesmo com a maioria dos jovens da aldeia. Foram contra os pais e rebelaram-se contra as tradições, seguindo cegamente Urnia. Contra todos os avisos formaram a guarda de Urnia que os mais velhos julgavam que mais tarde seria tornado num exército de invasão. O descontentamento em relação a Urnia tinha crescido imensamente na população adulta, mas os jovens olhavam para ela como uma Deusa e um exemplo.
Foi-me também explicado que tinha sido profetizado à muito que um grande mal iria assolar a tribo e que só alguém que não seria parte deles conseguiria livrar esse mal. Esse alguém era eu.
Mais tarde quando comecei a recuperar das feridas mais severas, troquei a minha roupa com as minha antiga pele por um vestido simples, Jorin, a filha do curandeiro que tinha tratado de mim ajudou-me a percorrer a aldeia, visto que era cega eu estava a ser os seus olhos enquanto ela me ajudava a caminhar. Muitos adultos vieram ter comigo pedir-me desculpas, incluindo aqueles cujos filhos eu tinha morto, senti-me terrível e pedi imensas desculpas a todos apesar de não terem sido aceites. Diziam que o favor que eu tinha prestado nunca poderia ser pago e que os seus filhos tinham feito a escolha deles.
Conforme os dias foram passando, consegui aventurar-me fora da cama sem a ajuda de Jorin, mas não dispensei a sua companhia, era uma rapariga tímida e divertida que ansiava descobrir coisas novas, mas a sua condição não a permitia. Portanto ajudava-a a entender as coisas fora da segurança da sua casa que já conhecia como a palma da mão e fazia-a aventurar-se cada vez mais longe.
Um dia mais tarde, Taril, pai de Jorin, recebeu a presença de Yorgsh em sua casa. Após vários dias sabendo pouco sobre quem me tinha acolhido quando era apenas uma criatura selvagem, senti-me feliz por Yorgsh me ter procurado. Passamos umas quantas horas a comentar e a debater o sucedido com algumas intervenções surpreendentemente inteligentes de Jorin até que Yorgsh finalmente tocou no assunto. Unga tinha acordado e já estava saudável o suficiente para receber visitas.
Yorgsh viu a felicidade na minha face e ambos fomos para sua casa o mais rápido que o ancião podia. No meio da minha alegria não vi o pior problema que poderia surgir e que cravou mim pior do que qualquer lâmina. Unga estava ainda acamada, mas já se sentava, as feridas na cara quase tinham desaparecido e já parecia bem revitalizada, mas ao ver-me Unga mostrou um olhar interrogativo e confuso.

- Quem é? – Perguntou ela num tom inocente.
- Ela é quem nos salvou Unga, ela foi quem te salvou, o nome dela é Skor.
- Skor? – Questionou-se incrédula. – Não! Não pode! Skor é o meu lobinho!

Não consegui responder, a minha cara certamente estava marcada de dor, senti as lágrimas a correr pela minha cara e pedindo desculpas abandonei a casa de Yorgsh. Num andar rápido. Voltei para a casa de Taril e desculpando-me como indisposta tranquei-me no quarto. Lá tinha um espelho feito de bronze polido. Levantei-me e olhei-me nele. Tinha lágrimas a percorrer-me os olhos azuis como o céu e a cara de tom pálido ainda marcada de algumas cicatrizes.
Cai na cama. Ela não me reconhecia, mas também tinha razões. A mudança que Xana me proporcionara fora boa para atingir os meus objectivos, mas agora, tudo caía.
Jorin entrou pelo meu quarto dentro ao ouvir-me chorar, aproximou-se com cuidado para não tropeçar em nada e sentou-se ao meu lado. Falamos pois eu pensei que ajudaria, mas a tristeza nunca me largou. Ela confortou-me, disse-me que as coisas iriam ficar melhores, mas eu simplesmente não acreditei, pedi-lhe que me deixasse sozinha e dormi.
Os próximos dias passaram-se lentamente. Yorgsh tinha-me convidado a voltar para a sua casa mas recusei, por razões óbvias. A minha tristeza era evidente, mas não parei de ajudar. Quer fosse a fazer recados para Taril, ou ajudar Gan na forja, pois era algo para que tinha jeito e me acabava por acalmar. Jorin tinha-se mantido comigo a maioria do tempo, mas agora começava a deambular um pouco mais sozinha. O seu sentido de orientação começava a fascinar-me. Ganhei como habito ir para um monte perto da aldeia e deitar-me sob a relva e olhar para a lua, acompanhando o seu ciclo pelo céu.
Um dia quando o dia acabara o trabalho, deixei Jorin em casa e desloquei-me para o tal monte. Fechei os olhos e deixei o ar fresco da noite de lua nova embalar-me.

- É um bom sítio. – Disse uma voz que eu não esperava ouvir e pensando ser alucinação da minha mente mantive-me em silencio. – Não sei se queres que te faça companhia, especialmente depois da minha atitude.

Mantive-me em silêncio e de olhos fechados, se fosse uma alucinação, preferia não quebrar o encanto.

- Desculpa-me, eu devia ter sido mais razoável, devia ter entendido! Passaste por tanto.
- Tu também Unga. – Respondi eu. Até agora notei o quanto a minha voz tinha mudado. Sentei-me e olhei para ela. Ela respondeu com um sorriso. – Passamos ambos por tanto, no entanto, não posso julgar as tuas atitudes. Já olhaste bem para mim? Estou… estou tão diferente.
- Eu sei. – Ao dizer isso ela sentou-se ao meu lado, os seus olhos não largavam os meus, era uma sensação estranha. – No entanto, a mudança pode não ser para o mal, não importa do que aconteça.

Com essas palavras ela abraçou-me. Eu não resisti e abracei-a em resposta. Senti-me outra vez o lobo nos seus braços e o meu coração disparou. Havia tanto para falar, mas nada dissemos. Mantivemos-nos em silêncio. Com a lua nova a sorrir como uma criança por cima de nós.

Fim.

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quando eu digo fim, é fim mesmo, a Saga terminou. Finito.
Há questões que não foram resolvidas?
Isso talvez virá noutra historia... esperemos para ver, visto que o poster é louco e anda a a meter comments de java script nisto
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P.s.: não, a Skora não scorou com a Unga!!

domingo, setembro 14, 2008

Saga da Lua

Guerreira Lobo


Subi até ao ramo de onde Kandia pendia e gentilmente fi-la descer até ao chão onde a Kaly a agarrou suavemente nos seus braços. Enquanto voltei a descer a Kaly removeu a corda em volta do pescoço e abraçou-se a ela com força. Não me pronunciei, eu tinha uma ligação com Kandia, mas não seria tão forte como a que Kaly possuía.
Ela não chorava, só se mantinha de olhos fechados agarrada à amiga, como se tivesse medo que ela a abandonasse. Mas Kandia já tinha partido, e não podia ser feito nada. Fechei os olhos tentando manter-me senhora dos meus sentimentos, não queria voltar a deixar a tristeza ou a raiva tomar conta de mim pois ainda tinha trabalho a ser acabado, a minha mão precisava de se manter firme e para me distrair decidi começar a cavar. Cavei em silêncio com as minhas próprias mãos na terra húmida da floresta. Ainda não tinha reparado, que as minhas mãos não estavam feitas para trabalho, eram pequenas, com dedos delicados e suaves. Parei por um pouco e esfreguei-as tentando entender como tais mãos conseguiam agarrar uma espada colossal como aquela, com tanta firmeza. Abanei a cabeça, afastando os pensamentos que me percorriam a mente e concentrei-me a cavar.

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Pouco passava da alvorada na aldeia de Yorgsh e a confusão já estava instalada. Um dos guardas de Urnia tinha voltado de uma missão incutida pela sua líder, o único sobrevivente de uma equipa de três.
Desde a estranha partida do lobo, as coisas tinham mudado nessa aldeia. Urnia tinha tomado controlo do povoado e criado uma guarda privada, sob o pretexto que Yorgsh estava demasiado afectado pelos últimos acontecimentos, precisando de repouso e que a aldeia já não estava segura, precisando de treinar melhor os seus jovens Trolls nas artes de guerra. Apesar de um pouco descontentes com a mudança repentina, os habitantes da aldeia não questionavam a sua líder e os acontecimentos desta madrugada apenas reforçavam a ideia de Urnia.
A líder estava perto da entrada com uma pequena multidão. O seu guarda encontrava-se com os joelhos no chão e aos seus pés as cabeças decepadas dos seus dois companheiros. Ele termia compulsivamente e um burburinho crescia na população assustada e horrorizada. Urnia olhava para as duas cabeças sem vida com uma mão sobre a boca, com os olhos abertos em choque.

- O que se passou? – Questionou ela. – Quem fez isso?

- O seu nome é Skor. – Disse o Guarda tremendo.

- Skor? Como é que aquele lobo podia ter feito isso?

O guarda saltou com essas palavras e com os olhos repletos de terror continuou.

- Não era um lobo! Era um demónio! Matou Lancio e Tarvo com um golpe cada um. Eles nem tiveram tempo de responder. – O guarda abraçou-se a si próprio e olhou para o chão tremendo. – Era um demónio branco, erguia-se nas pernas como nós, tinha a pele branca como a neve, os seus olhos eram grandes, azuis, gelados como o pior dos invernos e a sua forma é uma mentira, ilude-nos de fraqueza mas na realidade possui uma força monstruosa! Não podemos fazer nada! Estamos condenados.

Urnia fechou os olhos, ao ouvir a população preocupada e amedrontada. As coisas não estavam a correr bem, este novo perigo era inesperado. Ao livrar-se do lobo ela pensou que poderia descansar sem perigos mas com este novo aparecimento ela encontrava-se numa situação que não saberia lidar. Calmamente ela juntou alento e dirigiu-se ao sou povo com palavras de coragem. Pediu coragem e esperança, lembrou que o seu povo tinha passado por vários desafios e tinha-os conquistado todos e a história repetir-se-ia. Convocou mais guerreiros, mais Trolls para a guarda da aldeia e prometeu que o mal que assombrava a aldeia seria banido de uma vez por todas. Essa última promessa significava o fim de Unga.
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As chamas amansaram e a campa estava feita. Ergui-me e esfreguei a testa, limpado o suor. Estava cansada e devia estar cheia de terra, começava a achar os meus cabelos grandes demais pois muitas vezes se meteram á minha frente e as suas pontas estavam todas sujas da terra. Sai do buraco que tinha escavado e olhei de volta para a Kaly. Ela olhava para mim com um sorriso triste e com os braços ainda envolvendo Kandia. Levantou-se e carregou a Kandia até a campa improvisada criada por mim, onde a deitou. Ajoelhou-se e começou a emitir um estranho gemido parecido com um riso.

- Sabes o que é a coisa mais frustrante disto tudo? – Questionou ela. – Eu estou triste, uma grande amiga morreu. No entanto não consigo chorar, simplesmente não consigo.

Coloquei-lhe a mão no ombro. Como conforto, mas não tinha palavras para dizer, eu estava tão desolada, mas ao menos já tinha deixado a minha raiva e tristeza sair, ao contrário de Kaly que não conseguia soltar os seus sentimentos. Enterramos juntas a Kandia enquanto que o rapaz do “bring” permanecia estático sem fazer qualquer som. Lentamente Kandia foi coberta de terra. Kaly fez um pequeno e crude arranjo de flores que colocou em cima da sua campa sorriu como despedida e depois levantou-se.

- Eu vou partir. – Avisou-me ela.

- Vais?

- Sim. Eu prometi-lhe ajudar-te e assim o fiz. Agora tenho de seguir o meu caminho.

- Eu entendo. – Respondi-lhe sentido o pesar e tristeza na sua voz.

- Mas foi bom conhecer-te. Para alem do mais, se não te tivesse conhecido nunca me teria despedido dela.

Mantive-me em silêncio com um sorriso complacente. Continuava a não conseguir dizer nada, não tinha força para tal e nada do que pudesse dizer traria Kandia de volta.

- Promete-me só uma coisa. – Continuou ela com um ar mais sério.

- O que é?

- Vinga-la.

- A minha missão levar-me-á por esse caminho Kaly, não precisas de te preocupar com isso.

Sem trocarmos mais alguma palavra a Kaly abandonou o local. Sem ela eu perdi o controlo e cai de joelhos. Levei as mãos ao chão com medo de perder o meu equilíbrio. Tinha um sorriso estampado na cara mas o meu interior estava praticamente o inverso. A Kandia estava morta e eu não conseguia parar de pensar que a culpa teria sido minha. Grizaldo e Brot também estavam perdidos e era tudo minha culpa, tanto sofrimento e eu não entendia porquê. Não entendia nada, não me lembrava de nada, a minha única personalidade era aquela que Unga me tinha dado no momento em que nos encontramos, eu não era ninguém! Respirei fundo e gemi por entre dentes cerrados. Não estava certo, nada disto, toda a gente tinha uma opinião, toda a gente tinha um objectivo e eu era simplesmente puxada de um lado para o outro ao desejo de qualquer outra pessoa. Respirei fundo outra vez. A tristeza transformou-se rapidamente em desespero e o desespero em raiva.
Levantei-me abruptamente. Desloquei-me até à árvore mais próxima e com um grito enfurecido comecei a esmurrei-a violentamente até sentir a minha pele a romper. Ofegante e com as mãos a pingar sangue não resisti em dar uma cabeçada violenta contra a arvore berrando terrivelmente.

- Unga… – suspirei

Lembrei-me outra vez do seu rosto. Era por ela que eu fazia isto, não podia desesperar, não enquanto ela estivesse a sofrer. Ela era a minha razão, fazia isto por ela e não me importava quem me manipulava pelo caminho, desde que conseguisse fazer com que ela ficasse bem.
Encostei-me à árvore e respirei fundo. Olhei em frente para a clareira que já me acolhera três vezes. Não o podia negar, muito mudou desde que entrei neste mundo, apesar de parecer ter passado um curto espaço de tempo e nada tinha sido bom. Olhei para a minha espada cravada no chão, ainda não tocar nela desde que enterramos a Kandia, por um lado tinha medo de lhe voltar a tocar, a raiva e fúria que sentia quando a tinha na minha mão era um monstro terrível dentro de mim, no entanto, precisava dela para cumprir a minha missão e não podia esconder que a achava irresistível, como se cantasse um chamamento sinistro sobre mim.
Lembrei-me que não estava sozinha, olhei para o rapaz que Kandia tinha criado para me acompanhar. Ele continuava estático a olhar para o nada, com um olhar vidrado, sem qualquer emoção, sinal de pensamento ou vida.

- Hey!

Tentei chama-lo à atenção. Passava-se claramente algo de errado com ele, nem o seu som característico fazia. Aproximei-me dele lentamente tentando comunicar com ele, mas sem sucesso, até que quando lhe toquei ele desfez-se em pó. Dei um salto para trás e deixei escapar um pequeno grito de susto, não foi algo que estava à espera.

- Chegaste… – Falou uma voz que provinha por deras de mim.

O conjunto de eventos tinha me deixado assustadiça, portanto ao ouvir a vós dei outro salto e outro pequeno grito virando-me rapidamente para trás. Ao olhar para quem falava comigo cai no chão com os olhos esbugalhados. Perante mim estava o que parecia ser uma forma espectral de Kandia. Ela olhava com uma expressão severa, mas não tive medo, para alem do choque que recebera, a sua presença dava-me alento.

- Tu sabes o que tens de fazer. – Disse-me com um sorrizo.

- Kandia, tu… - Gaguejei, não conseguindo acabar a frase.

- Sim, estou morta. O meu pequeno golem carregava um resto da minha força vital e é por isso que estamos a ter esta conversa. – Ela fechou os olhos e fez um movimento como se inspirasse antes de declamar. – Apesar do meu corpo já não se suster, a minha curiosidade necessita de ser saciada. Descobriste o que querias?

- Não, acabei por ficar com mais questões. – Pronunciei-me por entre gaguejos. – E como sabes quem eu sou?

- Sempre soube Skor, mesmo quando não passavas de um lobo eu vi o teu destino. O que é traçado nas estrelas nunca conseguirei desvendar, mas o que foi escrito eu consigo ler. Tu és o ser que veio limpar o antigo mal das nossas terras. – Ela fez um breve silencio antes de prosseguir. Eu continuava mortificada no chão. – Confidenciei com Urnia o que descobri nas minhas conjurações. Foi um grande erro. O tempo passou e ela foi ficando mais hostil, tentou manipular o futuro para seu próprio proveito. Especialmente quanto eu mencionei que para o bem de todos iriam ser feitos sacrifícios. Os filhos foram os dela e for ai que se mostrou realmente que fazia parte dela o nosso grande mal. E agora ela planeia acabar com a vida da sua única descendente, coitada, não por sua vontade mas pela escuridão que tomou conta dela agarrando-se à sua angústia. Tu sabes o que tens de fazer. Vai.

- Obrigado Kandia. – Disse, não sabendo porque razão agradecia, mas sentindo mais apaziguada. – Obrigado por tudo.

Levantei-me e peguei na minha espada. Sorri para Kandia, ela respondeu-me também com um sorriso e a sua essência desvaneceu no ar. Sozinha na clareira, observei a lâmina com um sorriso na cara, a minha mente estava calma e aliviada. Só restava fazer uma coisa.

Confiante e convicta, corri pela floresta com uma velocidade estonteante. Só pensava em chegar à aldeia e acabar isto, não parei por nada nem ninguém. Lentamente, as árvores começaram a ficar menos densas até que finalmente sai da floresta perante mim estava a aldeia dos trolls, movimentada para algum ritual que estava a decorrer. A guarda estava reforçada desde a última vez que estive aqui. Mas nada disso tirou-me o ânimo. Levantei a minha espada bem alto acima da minha cabeça e gritei como nunca antes gritei. Um grito de vitória bem antes da batalha começar. A aldeia estremeceu. Não estavam prontos para a fúria que estava prestes a vir.

segunda-feira, setembro 08, 2008

Saga da Lua

Guerreira Lobo

As expressões no espelho continuavam a ser-me estranhas, mas cada vez mais me familiarizava com elas. Eu ia passando o cabelo de um lado para o outro, tocando no meu rosto e sentido as minhas próprias mãos. Tudo aquilo era demasiado estranho para mim, ainda á poucas horas era um lobo e agora era humana, a sensação de mudança era incrível e algo confusa, as minhas pernas tremiam e os movimentos eram desajeitados, ainda não me habituara. Enquanto eu tentava entender esta nova forma de ser, a Xana, já aborrecida com a minha lentidão a interiorizar o meu novo estado, soprava incessantemente a franja que acabava sempre por voltar ao mesmo local.

- E agora? – Perguntei eu enquanto fazia sombras de animais com as mãos.

- Agora fazes o coelho. Precisas de esticar o do meio e o indicador para fazer as orelhas…

- Não, não é isso. – Interrompi. – Quero saber o que faço agora, em relação aos Trolls. Para alem do mais, o coelho já fiz.

- Ah, esses! Pois, tinha-me esquecido que tu fizeste tudo isso por causa deles… ou melhor… dela. – Ela deu uma gargalhada trocista fazendo-me cerrar os punhos com raiva.

- Cala-te.

- Oh não, não me leves a mal claro, é que, dantes pelo menos eram de sexos opostos, agora nem isso, já não chega o problemazinho da raça! – Continuou ela por entre um rizo de escárnio.

- Cala-te! – Gritei já com os olhos baixos e com a raiva a queimar as minhas veias.

- Tu não sabes a sorte que tens… - afirmou Xana acabando por controlar os risos. – Se fosse por mim, já tinhas um cristal de gelo no teu coração. E jazias morta por tamanha insolência. Mas as minhas irmãs iriam acabar comigo caso isso acontecesse.

- Eu não seria morta por alguém como tu! – Rosnei, virando-me depois para ela e continuando. – Eu tenho uma missão! Eu vou salvar a Unga!

Este ultimo grito trespassou a minha mente e a realidade, a fúria que eu senti congelou-me mais do que o frio do coração da mulher que estava perante mim. Aquele sentimento, aquela sede, eu estava com medo de mim mesma, era uma raiva que eu não tinha controlo, que se movia dentro de mim insaciável e voraz, ansiando por ser liberta, após vários anos de hibernação. A Xana viu a minha expressão de espanto e sorriu, esse sorriso tornou-se num pequeno riso, e esse riso transformou-se em gargalhadas. Enquanto ela se ria começou a elevar-se, a flutuar dentro da caverna até se estacar a meia altura. Olhou para mim com o seu sorriso cristalino e repleto de loucura, os seus olhos azuis tinham-se transformado em vigorosas chamas dessa mesma cor, e o seu cabelo ondulava descontroladamente como se fosse fogo.

- Agora entendeste. Acorda conquistadora! O teu caminho ainda está para ser feito com o sangue dos teus inimigos. – Ela ergueu a cabeça e os braços perante o meu olhar esgazeado. – É a hora! O caminho a percorrer está aos teus pés! Deixa esse sentimento ser o teu guia e goza de todo o momento de prazer por ele oferecido.

Com o discurso finalizado ela irrompeu em risos e a sua forma foi ficando mais espectral até que com um rizo prolongado a sua forma lança-se contra o tecto perfurando-o e desaparecendo. Segundos depois o tecto tremeu e um grande bloco de gelo caiu no chão rachando-se em dois. Os meus olhos abriram em espanto quando me deparei com o que se encontrava perante mim. Dentro do cristal de gelo que se quebrou estava uma espada, cabo negro e trabalhado com rigoroso detalhe, com duas cabeças de lobo, cada uma virada para o seu lado, rosnando ferozmente, os olhos dos lobos eram rubis e entre os dois tinha outro maior e em forma de sol. A lamina, em que metade estava enterrada no gelo era prateada e cintilava com um brilho fenomenal, parecia acabada de ser forjada por alguém perito na profissão, não tinha um único erro na lamina perfeitamente afiada. Senti o meu coração pulsar mais fortemente ao vê-la ali quieta como se fosse oferecida a mim. Avancei com passos incertos e com um sorriso crescente na cara sem conseguir afastar o pensamento da cabeça. “foi feita para mim”. Quando reparei já tinha a minha mão a agarrar no cabo, sentia-me em transe, como se algo tivesse a tomar conta de mim. Sem muita dificuldade retirei a espada do gelo e erguendo-a sorri ao observar a sua majestosa imponência.

Chamei pela Xana, mas ela não me respondeu, pareceu-me já não estar na sala, no entanto o vento trouxe a sua voz, sedutora e melosa. “Deixa que o destino conduza a tua mão.”

Caminhei para fora da caverna, não sabia quanto tempo se passara desde que a Xana me tinha mantido ali, nem sabia qual era o destino de Kaly e o rapaz dos brings. Saí da caverna com o sol a queimar-me os olhos, temi que a minha estadia ali tivesse sido longa demais, ainda por cima não havia sinal dos dois que me acompanhavam. Suspirei e sentei-me na entrada da caverna com a espada encostada a mim, enquanto tentava habituar-me à luz do sol. Olhei para o céu sarapintado de nuvens escuras e pensei em tudo o que me tinha acontecido. Desde que cheguei de memoria apagada, até ao encontrar a Unga e a minha estadia com os trolls e os eventos que tinham levado a esta demanda forçada. Recordei-me da Unga, da última vez que a vi e da tristeza nos seus olhos e a dor que sentia. Não consegui resistir às sensações e chorei, era injusto causar tanta dor sem razão, porque Urnia não teve nenhuma razão para o fazer, para alem de um louco desejo que eu desconhecia completamente, Yorgsh avisou-me que não era a sua mulher, que era algo que a controlava mas nada disso interessava, eu só a queria ver morta. Senti raiva de mim ao ter esses pensamentos, mas não conseguia controlar-me, só queria ver a Unga de novo a sorrir, sem medo e queria fazer quem lhe fez tanto mal pagar.

Envolta em choro gritei do fundo dos meus pulmões como um uivo que enquanto fui animal nunca o consegui dar. Após esse grito, a tristeza e o medo evaporaram-se. Peguei na espada com convicção e caminhe dali para fora. Mas após começara descer a montanha deparei-me com um pequeno acampamento em que estava Kaly a olhar para mim com ar de espanto e o rapaz, amordaçado, com os braços e as pernas amarrados, pendia de cabeça para baixo num tronco de uma arvore. Eu aproximei-me cuidadosamente, pois reparei que Kaly debatia para entender a minha presença ali. Mordi o lábio inferior com um sorriso tímido e olhos ainda vermelhos do choro, já me tinha visto ao espelho mas não sabia como outras pessoas me veriam e nem esperei que Kaly entendesse mas ela acabou por questionar gaguejando.

- Lobo?

- Sim… quer dizer… não propriamente agora um lobo mas…

- O que é que aconteceu? – Continuou ela, que assava qualquer coisa na fogueira.

- Não sei, simplesmente… adormeci e quando acordei estava assim. – Olhei para o rapaz que olhava para mim com um ar feliz, mesmo pendendo da árvore e com aquelas restrições todas.

- Ah, não ligues a ele. Depois de ter sido mandada para fora da caverna, quando tentei entrar vi que havia uma parede de gelo no caminho. Não consegui escavar por ela, portanto voltei para trás e montei o acampamento. Entretanto essa criatura acordou e não parou com aquele barulho infernal, portanto decidi enfia-lo ali. – Ela tirou o que assava do fogo, que não passava de uma maçã e mordiscou um pouco. – Não te preocupes, cheguei à conclusão que ele não precisa de comer, respirar ou outras necessidades físicas que nós possuímos. Já agora… não tens fome?

Kaly mostrou alguma comida que tinha guardado desde que desapareci e então uma fome aterradora apoderou-se de mim. Comi até me fartar, contando a Kaly todos os detalhes do que aconteceu que ela devorou interessadíssima, enquanto de vez enquanto ia batendo com o pau onde assara a maçã no rapaz. Fiquei a saber que Kaly tinha aquele aspecto estranho pois não era uma criatura normal. Ela tinha morrido e Kandia que era sua amiga, pois ambas eram feiticeiras e tinham-se conhecido à anos nas reuniões de Feitiços & Tuperwares, fez-lhe um ultimo favor. Dar-lhe uma hipótese de vingar. Portanto aquele corpo não era dela, pelo menos só dela, era uma mistura entro o seu corpo e algo que existia para alem deste mundo. Conversa metafísica que a mim não tinha muito interesse, mas gostei de saber um pouco mais sobre a minha companhia.

Mais tarde decidimos voltar para a cabana de Kandia. Após soltarmos o rapaz, mas a pedido de Kaly mantendo-o amordaçado, caminhamos calmamente pela floresta em direcção ao lago, com uma conversa amena. Estava a conseguir afastar todos aqueles sentimentos venenosos da cabeça e a sentir-me satisfeita por isso apesar de não ter durado muito tempo.

O cheiro a queimado já me tinha entrado nas narinas bem antes de chegarmos à clareira. Pensei ser um fogo florestal qualquer, mas nunca esperei ver tal coisa. Quedei-me em silêncio quando observei o espectáculo macabro perante os meus olhos. A casa de Kandia ardia e cá fora três trolls estavam de guarda, observando as chamas mas o pior pormenor, trouxe tudo de volta, engoli a seco quando vislumbrei por cima das suas cabeças, numa das arvores centenárias que preenchiam aquele recanto da floresta, Kandia pendia de olhos fechados e expressão serena com uma corda à volta do pescoço. Eu não gritei, eu não afastei a cara em horror, eu não senti, eu não chorei. No entanto dentro de mim, aquela raiva voraz acordou outra vez. Mordi o lábio inferior e termi até sentir o sabor a sangue. Um dos trolls viu-me e fez sinal aos seus companheiros que se meteram em posições de defesa. Foi a gota de água. Ignorei qualquer tipo de dor e lancei-me para cima de um dos trolls que tentou defender-se com a sua lança. A espada trespassou lança, pele, músculos e osso. O sangue quente salpicou a minha cara e eu não consegui conter uma gargalhada, termia com antecipação do próximo que me atacasse. Assim que o vi a avançar a espada dançou nas minhas mãos e ele acabou cortado em dois. Olhei para o que sobrava com um sorriso vitorioso, a espada termia nas minhas mãos, ela queria mais sangue, eu queria mais sangue. A minha fúria gritava por ele, pedia-o e queria ser saciada. O ultimo troll apavorado largou a sua arma e começou a fugir. Eu cravei a espada no chão e corri em direcção a ele. Sentia-me um animal, pior do que alguma vez me senti enquanto lobo. Rapidamente alcancei o troll e saltei para cima dele, os meus punhos fechados embateram vezes sem conta na sua cara até me sentir satisfeita sem o pôr inconsciente. Levantei-o e abanei-o.

- Quem te enviou? – Ele não respondeu por isso soquei-o outra vez gritando de seguida. – Quem te enviou?

- F.. Foi… a Urnia.

Sorri-lhe com uma raiva a trespassar-me o corpo, mas a vida dele tornou-se insignificante para esta fome, portanto decidi ser criativa. Arrastei-o para perto dos seus companheiros mortos. Decapitei ambos e envolvi a as cabeças num trapo que encontrei por ali. Entreguei-as ao troll e disse-lhe ao ouvido com um sussurro louco.

- Leva-os para a Urnia… diz-lhe que a Skor manda-lhe comprimentos.

Após isso empurrei o troll que se pôs a correr desenfreadamente. Suspirei e assim que ele desapareceu, sem queixume deixei as lágrimas escorrerem. Kaly olhava para mim surpresa e assustada, mas foi algo que decidi ignorar. Kandia precisava de ser honrada.